Stadt: Leipzig

Frist: 2021-03-31

Beginn: 2021-09-15

Ende: 2021-09-19

URL: http://lusitanistenverband.de/lusitanistentage/leipzig-2021/

O relógio da vida não anda para trás: gravidez, doenças, envelhecimento e o corpo-cronômetro

Janek Scholz, Universität zu Köln: janek.scholz@uni-koeln.de
Jasmin Wrobel, Freie Universität Berlin: jasmin.wrobel@fu-berlin.de

Temporalidade e finitude estão escritas no corpo humano através do processo de envelhecimento e da progressão de doenças. Com cada tique-taque do corpo-cronômetro, estamos nos aproximando do nosso fim. Nesta época da auto-otimização, tentamos retardar o processo de envelhecimento natural e forçar uma “parada” ou até a “volta” a uma physis anterior. Ao mesmo tempo, a velocidade com a qual temos que enfrentar nossa mortalidade é acelerada por doenças degenerativas. Quando a própria finitude se encontra diante dos olhos, surgem reflexões e diálogos com o passado. Episódios vividos e não vividos invadem a consciência, assim como palavras ditas e não ditas; lembranças da infância e momentos-chave da própria vida substituem a história mais recente e dificultam a experiência consciente do presente. Isso vale tanto para lembranças positivas como para traumáticas: a mente e a memória podem se tornar tanto lugares de abrigo quanto de detenção. O tempo, porém, pode adquirir um efeito curativo, como quando o Eu atual se posiciona em uma distância objetiva em relação ao Eu mais antigo que vivenciou momentos traumáticos ou perdas dolorosas.

A temporalidade também está escrita – e de maneira visível ao mundo exterior – no corpo feminino durante a gravidez, na qual desde o início o “corpo compartilhado” é alvo de apreciações feitas por diferentes grupos sociais. As mudanças físicas, o aumento do corpo-cronômetro e outros efeitos colaterais da gravidez geram mudanças na autopercepção e na forma como se é percebida pelos outros. Defrontar-se com a passagem do tempo é uma reação inevitável, principalmente quando a gravidez não é desejada pela mulher, que precisa então tomar uma decisão rápida sobre o próprio corpo e a própria vida.

As marcas temporais do corpo não têm um efeito exclusivamente pessoal. As doenças e a velhice causam um desconforto coletivo e são consequentemente silenciadas nas sociedades ocidentais. Isso as torna uma categoria de discriminação. Numa sociedade que celebra a juventude, a produtividade, a atividade e a funcionalidade do indivíduo, parece não haver espaço para a velhice, as doenças e as mudanças visíveis do corpo e da mente. Entre a autopercepção e a percepção dos outros, são colocadas em questão a responsabilidade, a resiliência e a autonomia de idosas, idosos e doentes.

No entanto, cada vez mais as pessoas afetadas vêm fazendo frente ao silêncio e à exclusão física. Através de manifestações políticas (como demonstrações), artísticas (como textos autoficcionais) e individuais (como a amamentação em lugares públicos), essas pessoas ocupam o espaço público e tornam visíveis a temporalidade, a finitude e os novos começos. A discussão em torno da autodeterminação (física) abrange ainda a capacidade de tomar decisões sobre o fim da própria vida: o suicídio (assistido) e a eutanásia como “saídas” autocontroladas causam reações e avaliações muito diferentes, dependendo do ponto de vista (religioso, ético, político) sob o qual são discutidos.

Discutindo e ampliando perspectivas e projetos internacionais de pesquisa (como o projeto PathoGraphics na FU Berlin, patrocinado pela Fundação Einstein), esta sessão quer abordar a conexão entre corporalidade, temporalidade e finitude no mundo lusófono, partindo de uma perspectiva interseccional, incluindo estudos literários, culturais e de mídia; a matriz teórica é formada pelas Age Studies, Dis/Ability Studies, Gender Studies e Queer Studies. De que forma o tempo marca o corpo? Quais estratégias estéticas usam autoras, autores e artistas para evidenciar mudanças corporais no decorrer do tempo? Qual é a relação entre a autopercepção e a percepção externa do corpo em mudança, em conexão com os papéis sociais? De que maneira muda a percepção do tempo para grávidas, doentes ou pessoas na terceira idade? Como encenar as lembranças (corporais)? Para discutir essas questões, os seguintes aspectos temáticos podem servir de auxílio:

  • Processos de envelhecimento, como descritos em A máquina de fazer espanhóis de Valter Hugo Mãe (2010), Leite Derramado de Chico Buarque (2009) ou na BD/HQ Aos Cuidados de Rafaela de Marcelo Saravá (2014).
  • A percepção do passado, do presente e do futuro no contexto de doenças degenerativas como o câncer, como na novela Hanói de Adriana Lisboa (2013) ou na BD Daytripper de Fábio Moon e Gabriel Bá (2011), em cuja trama a vida do protagonista é encerrada diversas vezes por causas distintas.
  • O corpo moribundo e sua invasão do espaço público: HIV e Aids como Momento mori coletivo (como no filme Cazuza: O tempo não para de Sandra Werneck e Walter Carvalho, de 2004, o filme Boa sorte de Carolina Jabor, de 2014, assim como as obras ficcionais de Silviano Santiago e Caio Fernando Abreu).
  • Alterações físicas extremas como recomeço: o corpo que muda por causa de obesidade (como em A gorda de Isabela Figueiredo, 2016) ou gravidez (o filme A Vida Invisível de Karim Aïnouz, 2019) e a subsequente ruptura com expectativas sociais de crescimento e produtividade.
  • Produções artísticas que abordam doenças cognitivas como Alzheimer ou demência (o conto Viagem a Petrópolis de Clarice Lispector, 1964) ou doenças psicológicas e mentais como a depressão (o filme Boa sorte de Carolina Jabor, 2014) e discutem tanto a perda de controle pela doença como as terapias que a elas se aplicam.
  • O planejamento da própria morte: o suicídio como “saída” (como o filme Somos tão Jovens de Antonio Carlos da Fontouras, 2013).
  • Formas de lembrar: diários, fotografias, vídeos.

Interessados e interessadas devem enviar até 31/03/2021 suas propostas de contribuição com aproximadamente 500 palavras, incluindo uma breve descrição da trajetória acadêmica.


Referências bibliográficas:
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Beitrag von: Janek Scholz

Redaktion: Robert Hesselbach

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